‘Os gatos’, de Rodrigo Novaes de Almeida

Está em pré-venda de 10 dias (6 a 16 de abril) o mais novo livro do editor-chefe da gueto Rodrigo Novaes de Almeida. Quem comprar o livro durante esse período receberá o exemplar autografado.

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Link da pré-venda:

https://www.editorapatua.com.br/produto/261518/os-gatos-quinze-historias-extraordinarias-ou-ordi

Sinopse:

Nesta nova coletânea de contos, o escritor Rodrigo Novaes de Almeida traz para os leitores quinze contos inéditos nos quais gatos sempre aparecem, como protagonistas, coadjuvantes ou mesmo em sentido figurado. São histórias que nos revelam desde fragmentos do cotidiano mais ordinário, para onde podemos direcionar o nosso olhar a fim de obter o simples prazer de voyeurs, até narrativas insólitas com todos os ingredientes da mais rica tradição dos contos de terror.

trecho inédito do romance policial ‘Corpos hackeados’, de Andrea Nunes

Prólogo

Antônio nem suspeitava que aqueles seriam os seus dez últimos minutos de existência.

Com o documento de alta hospitalar finalmente assinado, sentia, na verdade, como se tivesse nascido de novo.

Ele passou a mão no queixo, os dedos brincando com a barba de três dias que negligenciara durante a internação, enquanto analisava tudo o que lhe acontecera.

Aqueles haviam sido os dias mais agitados de sua vida, pois tinha dado entrada num hospital beneficente para retirar uma pedra nos rins, que vinha incomodando-o há semanas, e fora muito bem atendido ali. Na verdade, bem atendido demais para os padrões da saúde pública brasileira.

Depois de uma bateria de exames, foi mandado para casa, deixando contatos para ser avisado quando surgisse uma vaga para a intervenção cirúrgica.

Ficou surpreso quando a moça de sapatos scarpins de verniz bateu em sua porta dois dias depois, lá na comunidade, dizendo que era do hospital. Não esperava que alguém viesse pessoalmente avisar sobre a vaga para a cirurgia. Nem esperava que essa vaga surgisse tão cedo.

A moça, jovem e educada, sentou-se na beira de sua poltrona com um maço de papéis na mão, e disse que, segundo as informações levantadas pela equipe de colaboradores do hospital, Antônio “atendia ao perfil econômico” da proposta que eles pretendiam fazer.

Antônio ficou cismado. Aliás, estava chateado: será que não iam mais tratar seu cálculo renal na cota beneficente? Será que o expulsariam do hospital, como acontecera com sua vizinha? Lembrou-se de que a coitada tinha ido extrair uma hérnia e descobriram que ela tinha plano de saúde, portanto não poderia se tratar de graça.

Bem, no caso dele não poderia ser isso, pois ele não tinha plano de saúde há muitos anos. Desempregado, vivia de biscates e virações para poder dar alguma contribuição nas despesas da filha Edilane, que vivia com a tia desde a morte da mãe.

Edilane era a coisa mais preciosa na vida de Antônio, e todo trocado extra que entrava no bolso ele destinava para comprar roupas novas para a menina, que estava ficando mocinha e precisava se arrumar melhor.

Foi por causa de Edilane que ele dissera “sim” para a moça dos sapatos de rica que o visitara naquele dia, com aquele sorriso esticado. Ele se lembrava, sobretudo, dos dentes. A boca arreganhada de simpatia parecia, na verdade, um tanto assustadora para ele. Antônio, que era um zé ninguém, vivendo à margem da sociedade, encandeou-se com aquela brancura dental. Não havia muitos sorrisos do tipo Colgate em sua vida.

Mas essa visitante era só o que eles chamavam de “aliciadora”. Um raminho insignificante da organização. Alguém que sabia que ele era um pai solteiro, devotado à filha e com grandes dificuldades financeiras. A mulher tinha até os registros da transferência da filha dele da escola particular para a pública, e o preço da aula de judô que ela havia pedido, mas que ele não pôde pagar. Essa aliciadora explicou que ele poderia receber um bom dinheiro se quisesse vender o rim. Na verdade, o processo seria bem simples, só precisava assinar uns documentos, umas procurações, coisa de rotina. Ia ser operado no mesmo complexo hospitalar onde comparecera para fazer os exames. O Hospital da Fundação Bio recebia pacientes do SUS porque era dedicado às atividades filantrópicas desenvolvidas pela Fundação. Mas Antônio seria operado num local diferente: a ala clandestina, que funcionava num bloco supostamente desativado do complexo hospitalar.

As autoridades que comandavam o local não teriam como suspeitar de que, numa ala onde só funcionava oficialmente a lavanderia hospitalar, funcionavam também pequenas salas de cirurgia clandestinas, camufladas sob o disfarce de área isolada para obras de reforma. Antônio daria entrada pelos canais normais do Hospital da Fundação Bio, mas, em vez de extrair a pedra no rim direito, seria discretamente removido para a ala clandestina para a extração do rim esquerdo, saudável. Passaria uma noite internado ali e, depois, seria transferido para a pousada que a organização mantinha perto do hospital, para a recuperação completa. Tudo parecia muito simples e organizado. Naturalmente, ele não poderia dizer nada a ninguém. Viveria muito bem com o outro rim, e poderia ter uma vida mais confortável, já que o dinheirinho daria para saldar as dívidas e ainda dar entrada no próprio negócio.

Não era isso que Antônio estava esperando, afinal? Pensou logo em Edilane, que arregalaria os olhos quando ele lhe comprasse aquela calça jeans de marca que havia visto outro dia, no shopping. Ela não pedira, é claro. Mas ele notara o olho comprido da menina quando passaram pela frente da vitrine, a cobiça da adolescente que a fizera interromper o passo por uma fração de segundo diante da peça de roupa. Depois, seu coração de pai encolhera ao ver o quão rapidamente ela se recompôs, desviando os olhos com fingida desatenção, para não ser flagrada desejando o que não era para o seu bico. Antônio odiou aquela resignação platônica de quem se habituara a não poder ter. Aquilo estava doendo cada vez mais: não poder dar pequenos luxos à filha. Mocinhas adoram se vestir na moda, e Edilane, por mais simples que fosse, não era diferente…

Quando ele assinou a papelada, não chegou sequer a ler aquelas letras tão pequenas. Estava pensando mesmo era no box que vira para alugar no mercado público, onde poderia montar seu armarinho quando a grana entrasse. Só Deus sabia como aquele dinheiro viria em boa hora.

A ficha de Antônio só caiu de verdade quando entrou no pequeno bloco cirúrgico clandestino. Deu por si somente quando percebeu as rodas da maca que o conduzia trepidando suavemente ao deslizar, as luzes redondas da mesa de cirurgia circundando sua cabeça, e dois pares de olhos frios por trás das máscaras cirúrgicas se aproximando, cercando-o como abutres que rondavam a presa.

O pânico o atingiu com força quando avistou os instrumentos cirúrgicos. Pelo amor de Deus, eles iriam mutilar seu corpo! Extirpariam um rim saudável, numa clínica clandestina que tinha o insuspeitado status de obra pública abandonada. E ele poderia morrer ali. Para todos os efeitos, seu corpo voltaria para a “ala oficial” do hospital e aquilo seria apenas uma fatalidade na extração desastrada do cálculo que ele tinha no outro rim!

Olhou de novo para o sinistro halo luminoso de luzes cirúrgicas em torno de sua cabeça e enxergou a cena tal como ela era: a auréola, o mártir, a penitência e a morte. Ele jazia impotente num altar forrado de branco, um cordeiro manso sacrificado em oferenda… ao quê?

A nada!

Nem morto ele seria alguém. Não haveria um minuto de glória sequer! Quem é que se importaria com uma coisa dessas? Gente pobre morria aos montes por falta de estrutura nesses hospitais…

Ficou surpreso por ter conseguido dar um pulo e correr. Não houve barreira humana nem física que tentasse impedi-lo, que o forçasse a ficar naquela sala de cirurgia.

Apanhou a calça que ficara pendurada na antessala do bloco cirúrgico, e meteu-a pelas pernas de qualquer jeito. Não houve tempo para calçar os sapatos, pois nesse momento começou a escutar os passos que vinham em sua direção, e entendeu que precisava sair dali. Mesmo estando naquele ambiente sombrio e deserto, seu senso de orientação o fez seguir na direção do barulho constante dos equipamentos da lavanderia industrial, que era por onde se dava a entrada daquela ala clandestina. Ele lembrava disso.

Guiando-se mais pelos sons e lembranças, ele se viu entrando pela única porta que dava acesso ao ruído metálico daquelas máquinas. Dali, atravessou um cubículo escuro cheio de sacos de roupas. Não atinava como tinham passado a sua maca por ali, mas se lembrava bem do cheiro ruim daqueles sacos. Estava no caminho certo. A porta que alcançou do outro lado dava acesso a um ambiente bem mais amplo e ventilado. Não havia funcionários ali, e ele atravessou aquela sala repleta de lavadoras e secadoras gigantes que emitiam rosnados ensurdecedores, correndo e se esgueirando como se fosse ele o bandido. Foi daquele modo que saiu da lavanderia e, consequentemente, do pavilhão abandonado.

Depois daquilo, ele não saberia dizer se correra por horas, ou por minutos. Os rostos e salas pelos quais passou ficaram registrados vagamente, como borrões em sua memória. Em determinado momento, notou que já havia alcançado a parte não clandestina do hospital, onde pacientes normais, médicos e enfermeiros circulavam tranquilamente. Mas se perguntava onde diabos ficava a saída.

Não demoraram a encontrá-lo, perdido na imensidão daqueles corredores. Percebeu que, ao abordá-lo, todos foram amáveis e compreensivos. Disseram que ele não precisava se preocupar, pois aquela era uma reação comum nas pessoas, que ficasse sossegado, porque eles compreendiam a desistência da cirurgia.

Antônio estranhara um pouco a insistência daquelas pessoas ao perguntarem se ele havia recebido visitas ou entrado em contato com alguém pelo telefone, nos momentos seguintes à sua escapada da ala clandestina, antes de ser localizado e reconduzido para o quarto onde antes aguardara a cirurgia, na ala oficial do hospital.

Ele não soube bem ao certo o motivo de ter ocultado daquele médico que o visitara no quarto o breve encontro que tivera com sua filha.

Antônio quase esbarrara com Edilane em sua “fuga” pelo corredor da enfermaria, poucos minutos antes de ser localizado pela equipe médica. Mas costumava ser muito cuidadoso com tudo o que dizia respeito à filha, e um pouco intuitivo também. Olhou nos olhos do médico e simplesmente decidiu que não era necessário contar que havia visto a menina depois de tudo o que passara naquele dia.

Mas o doutor parecia muito gente boa, e ele até relaxou um pouco durante a conversa. Falaram de futebol, do desempenho dos seus times no Campeonato brasileiro, e ele comentou que estava assinando sua alta. Acrescentou casualmente que, se Antônio mudasse de ideia nos próximos dias, talvez ainda estivessem precisando do rim. Prescreveu alguns analgésicos e calmantes, e disse que Antônio fizesse novos exames do cálculo renal em três meses. Ainda estava muito pequeno para precisar de cirurgia. Fez uma ligeira observação sobre a pressão arterial de Antônio, que sofrera um pico hipertensivo por conta da emoção, e recomendara mais duas horas de descanso com medicação anti-hipertensiva intravenosa. Depois, estaria liberado, acrescentou o médico, com uma piscadela.

Quando a enfermeira muito jovem entrou no quarto duas horas mais tarde, com um estetoscópio pendurado no pescoço, Antônio ficou satisfeito ao perceber que finalmente iria embora dali.

Ela aproximou-se com olhos muito tranquilos e, enquanto checava a auscultação cardíaca, comentou que a pulseira hospitalar que Antônio usara deveria ter caído durante a correria que ele empreendera nos corredores do hospital. Então, perguntou como estava se sentindo.

— Agora estou bem. Acho que minha pressão deve estar bem baixinha, porque estou até com sono. Meus olhos estão muito pesados — comentou Antônio, intrigado em perceber que sua voz também estava pastosa, a língua enrolando ao proferir cada palavra.

A jovem deu um sorriso rápido enquanto conferia o soro e informou:

— O senhor foi dopado com um calmante muito forte nessa medicação. Na verdade, é comum no protocolo hospitalar ministrar calmantes em crises hipertensivas decorrentes de descontrole emocional.

Ele ficou ligeiramente alarmado quando viu a moça suspender seu braço esquerdo, que estava tão inerte a ponto de ele mal conseguir mexer os dedos.

— Acho que a dosagem foi um pouco forte demais… — comentou, lutando para permanecer atento enquanto ela desembrulhava uma seringa e cutucava a axila do braço suspenso, aproximando a agulha do seu corpo.

— O que voschhê… colocou… nesshha injeção para mim? O que… exxtá… fazendo?

Os olhos da mulher assumiram um brilho frio que conseguiu arrepiar a nuca de Antônio, mesmo em seu estado de torpor. Ela levou a seringa vazia para o campo de visão dele, puxando o êmbolo de modo que se enchesse de ar, enquanto sussurrava:

— Na verdade, Antônio, como você vê, não há absolutamente nada nessa seringa. Só ar. E eu vou realmente aplicá-la em você agora, bem na sua axila.

Ele comprimiu os olhos pesados e sacudiu a cabeça:

— Nhã há nada aí? Mashhh… que diabo…

A frase foi interrompida pelo pequeno espasmo de dor que ele sentiu quando a agulha penetrou em sua carne, num ponto específico da axila esquerda.

— Não há modo mais eficaz de simular um infarto natural do que injetar ar no seu sistema circulatório bem nesse ponto, Antônio. Chama-se embolia gasosa.

A pupila de Antônio dilatava de pânico enquanto assistia, completamente inerte, a narrativa de seu fim, em tempo real, pela voz calma de sua assassina.

— Não se preocupe, você morrerá muito rápido. As bolhas de ar obstruirão seus vasos sanguíneos em instantes, e a morte será limpa e discreta.

Lágrimas se acumularam nos cantos dos olhos de Antônio. Não era mais possível distinguir se era dor ou medo. Ele engolia em seco de modo compulsivo, como se tentasse degustar os últimos segundos de consciência.

— Sabe por que adotamos esse método? É que nenhum perito médico legista, por mais minucioso que seja, procura por uma picada de agulha entre os pelos da axila de um infartado para averiguar se esse infarto foi provocado…

Sinopse

O futuro parece ter chegado mais cedo no Nordeste do Brasil quando uma das fundações mais ricas do país financia ali um projeto revolucionário sobre bioimpressão de órgãos humanos. Através dele, será possível implantar em pacientes com doenças terminais órgãos biológicos impressos em laboratório, dando a eles uma sobrevida inesperada. Mas, quando os pacientes voluntários desse projeto começam a morrer em circunstâncias misteriosas, aparentemente acometidos por um surto de perturbação mental, uma auditora da seguradora do hospital da Fundação e o cientista que desenvolveu o projeto mergulham numa corrida alucinante para desvendar quem está por trás de tais mortes. Para descobrir o enigma por trás dos assassinatos, os protagonistas precisarão compreender como pensam os inimigos do mais revolucionário projeto da Medicina atual, enveredando nos segredos do Corpo Humano escondidos no teto da Capela Sistina, e nos símbolos da Cabala. Precisarão também se deparar com as consequências filosóficas, políticas e psíquicas de reinventar o conceito de corpo através da engenharia genética. Se deslocando em cenários que variam do esplendor de Roma aos lúgubres cemitérios de um mundo pós-pandemia, terão de dar o melhor de si para desvendar essa trama, lutando contra suas limitações pessoais e seus próprios monstros. Na sua nova trama, Andrea Nunes une arte renascentista, tecnologia genética de ponta, tráfico de órgãos e outras das mais modernas formas de criminalidade contemporânea, lançando questionamentos inquietantes ao leitor sobre o bem, o mal, a ética e o que nos define enquanto Humanidade.

| trecho inédito do romance policial Corpos hackeados (Editora Cepe, no prelo; lançamento previsto para novembro de 2021. |

Andrea Nunes é promotora de Justiça em Pernambuco, membro da Associação Brasileira de Escritores de Romance Policial, Suspense e Terror — Aberst, e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba. Publicou os romances policiais O Código Numerati, em 2010, A Corte Infiltrada (Editora Buzz, Prêmio Bunkyo de Literatura 2019) e Jogo de Cena (Editora Cepe, Prêmio Aberst de Literatura 2019). Andrea também recebeu a menção honrosa no prêmio Dulce Chacon da Academia Pernambucana de Letras — melhor escritora nordestina (2015). Participou da Printemps Littéraire Brésilien, a convite da Universidade da Sorbonne, palestrando sobre literatura entre os anos de 2015 e 2017 nas universidades da França, Alemanha e Portugal, e foi convidada pela Universidade de Kopenhague e pelo grupo de estudos em literatura brasileira contemporânea para o VII Colóquio internacional sobre literatura brasileira contemporânea, realizado em 2018 na Dinamarca, onde proferiu palestra sobre a literatura policial brasileira. Foi ainda indicada pelo colunista e escritor Raphael Montes como um dos sete novos autores brasileiros para ler e se divertir, na sua coluna no jornal O Globo do dia 17.07.2017.

poema de Maraíza Labanca

Do livro A terra O corpo (Cas’a edições, 2021).

O pensamento em sua origem
— aqueles núcleos obscuros,
mais vastos que a terra, dentro,
lentamente,
têm o máximo de intensidade —
o influxo, na dosagem
de calor.

Restava equiparar as manchas
à irradiação do grande astro, ao fastígio
torturado de uma e outra.

Em que pese a sua forma,
uma aproximação rigorosa,
uma causa.

Porque a complexidade imanente
aos fatos concretos se atém,
progredindo da natureza do solo
extensa
à definição do que quer que seja

— sem leis —

Sujeita às perturbações locais,
a reações mais amplas,
às correntes, à monção
dos planaltos interiores:

são, no estio, atraídos ao entrar
dezembro pelas costas, desnudo,
irradiando toda a umidade
absorvida na travessia dos mares.

Canaliza-a, correndo em direção
àquele vento — um dizer natural, fora
de limites, prolonga-se, até que reabre,
outra vez, este intervalo:

a longa faixa de calmas,

o lento oscilar em torno,

o zênite,

levando a borda até os extremos,
de leste a oeste.

De súbito, mais íntimo, o destino
agitado dos alísios — irremediável —
chega de improviso, desnuda
a sua própria intensidade.

Os ares aquecidos entram.

Entrechocadas, uma e outra, de tufões
violentos, alteiam-se, retalhadas
de raios, nublando, em minutos,
o firmamento todo,

desfazendo-se,
logo depois, em aguaceiros fortes

sobre os desertos.

CAPA NOVA-supremoMaraíza Labanca nasceu em 1984, em Belo Horizonte. É doutora em Literatura Comparada pela UFMG e uma das editoras da Cas’a edições. Trabalha também com oficinas de escrita literária no Espaço a’mais. De sua autoria, publicou os livros Refratário (2012), Rés — livro das contaminações (com Erick Costa, 2014), Partitura (2018), Exceto na região da noite (2019) e A terra O corpo (2021).

‘Certos casais’, de Hugo Almeida, abre a coleção Rosa Manga da Laranja Original

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A Editora Laranja Original vai lançar no dia 27 de setembro Certos casais, de Hugo Almeida, organizador das coletâneas Nove, novena: variações (Olho d’água, 2016) e Feliz aniversário, Clarice (Editora Autêntica, 2020), e autor do conto “Ó”, publicado na revista Gueto nº 2. Com ele, a editora inaugura uma nova coleção, Rosa Manga. Leia aqui uma entrevista com o escritor.

Dividido em duas partes, Livro I e Livro II, Certos casais traz nove contos inéditos, alguns escritos há 30 e outros 20 anos. No entanto, o autor fez ajustes nos textos antes da publicação. A “live” de lançamento será na página do YouTube da Laranja original, na próxima segunda-feira (27/9), a partir das 19h30.

“No primeiro dos livros que formam este Certos casais, uma zona de sombra perpassa as histórias e faz o olhar desconfiar do que vê ou a pele desconfiar do que sente”, afirma na contracapa o escritor Francisco de Morais Mendes, autor de Sacrifício e outros contos. “O conjunto ganha uma textura de romance sem perda da autonomia e da consistência dos contos”, acrescenta. Na orelha, a escritora e tradutora Beatriz Magalhães, autora do romance Caso oblíquo, observa: “Para além da autonomia, ambos, o Livro I pelo entrelace e o Livro II pelo teor, podem ser tidos como minirromances”. No livro II está a história trágica do casal Curie, Marie e Pierre.

Mineiro residente em São Paulo desde 1984, Hugo Almeida (1952) tem mais de dez livros, entre eles o romance Mil corações solitários (Prêmio Nestlé 1988) e os infantojuvenis Viagem à Lua de canoa [incluído no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) de 2011], Todo mundo é diferente, Porto Seguro, outra história e Meu nome é Fogo. Doutor em Literatura Brasileira pela USP, organizou Osman Lins: o sopro na argila (2004), ensaios. Certos casais é seu quarto livro de contos. Os outros são Globo da morte (1975), Em teu seio Liberdade (1985) e Cinquenta metros para esquecer (1996).

dois poemas de Alessandra Martins

capa_sankofarespeite as mina preta

Sou vista há mais de 500 anos
como só corpo, só prazer.
Ela é branca pra casar,
eu mulher preta
pra escondido comer.

Preto, sei que a igualdade racial
não chegou pra mim nem pra você,
mas por eu ser mulher preta aumentam
mais ainda os paranauê.

Se põe no meu lugar, pra você ver.

Tive quinze filhos,
sofria dentro de casa,
enquanto meu marido
por aí batia as asa.
Me traía, violentava e
ainda me xingava.

Maldita sociedade — só maldade.
Quanto maior a melanina,
mais se aumenta a solidão.
É solidão…
porque parece que só sirvo
para lavar suas roupas,
fazer sua comida,
ser comida,
limpar seu chão.

Meu beiço, meu nariz,
meu cabelo
te incomoda?
Na primeira oportunidade
me troca
por uma padrãozinho,
na moda.

Ascensão, high society,
crescimento profissional.
Não quer uma preta do lado,
pois pode pegar mal.

Não sou de confusão.
Não vim para arrumar “treta.”
Mas estou aqui para dizer.
Respeite as mina!
Respeite as mina preta!

orgulho negro

Tenho orgulho de mim,
deixei de ser prego,
agora sou marreta,
pois já senti o que é ser
rejeitada,
cuspida, negada, maltratada.
Somente por ser preta.

Tenho orgulho da minha pele,
da minha carapinha.
Do afro que uso, dos meus
traços marcantes.
Minhas origens espetaculares,
dos colares, turbantes.

Tenho orgulho dos
guerreiros, dos sábios,
rainhas e reis verdadeiros.
Das minhas tranças,
das crenças,
das danças, comidas
e extravagâncias.

Tenho orgulho da minha raça,
da luta do meu povo.
Da liberdade conquistada,
da briga pela igualdade,
da insistência, resistência.
Do ontem lembrado
com tristeza, mas com orgulho.

Resistiram e chegaram
Vivos ao cais.
Tenho orgulho da esperança,
Força e coragem
que tiveram
meus ancestrais.
Orgulho Negro!

| poemas do livro Voa, Sankofa, voa! (Chiado Books, 2021), disponível no [link]. |

Alessandra Martins é natural de Duque de Caxias, Rio de Janeiro. É poeta, educadora e autora do livro Voa, Sankofa, voa!, publicado pela Chiado Books, em que usa a literatura marginal para denunciar o genocídio da população negra, a falsa democracia racial brasileira e os estigmas e estereótipos que são postos sobre o corpo negro em diáspora africana. No entanto, juntamente apresenta a exaltação da beleza negra, do orgulho e o regaste da ancestralidade.

piromaníaca, de Laura Elizia Haubert

capa_furacaoEla sentia intenso prazer quando via alguma coisa queimando à sua frente. Havia algo naquilo, aquela cor que só o fogo tem, aquela imensidão que só o fogo tem. Como é que as outras pessoas não ficavam assim, hipnotizadas? Como resistiam à vontade insana, que a fazia coçar os pulsos, de querer queimar tudo? Aquele instinto desgovernado era mais forte que ela, um negócio primitivo que se remexia por dentro e a fazia ficar mal quando não conseguia queimar. Se ela não queimasse algo não se sentia viva. Chegou ao ponto de não poder dormir à noite.

Não se recordava direito de como aquela obsessão tinha começado. E isso importava? Talvez não mais. O que importava é que, como os pequenos hábitos de infância que se tornam importantes, ele se manteve pelo resto de sua vida. E provavelmente a última coisa na qual pensaria antes de morrer, dali a 67 anos, é que ela gostaria de ser devorada pelas chamas de vez.

Se não se lembrava do começo, pelo menos se lembrava, com certo prazer, de quando recolhia as folhas de árvores e papéis do lixo caídos no quintal, até formar uma pilha enorme para queimar. E arder, arder, arder. E ninguém estranhava, ninguém imaginava o prazer que ela ocultava, o que acontecia à noite, ali do lado de casa, no terreno baldio, onde ela se infiltrava escondida para jogar o saco de lixo no latão gigante e, com muito furor, acender um fósforo e lançá-lo para o fundo, vendo as chamas estalarem.

Às vezes, quando estava assistindo o fogo crepitar, sentava-se tão paralisada que parecia uma escultura. O que ela via de tão fascinante? Não se sabe. Mas seus olhos tinham interesse pelo fogo, e seu corpo era desejo de fogo, e ela inteira queria ser fogo, bem lá no fundo, embora soubesse que não era possível ser assim tão quente.

Quando se esgueirava para entrar no terreno, tomava cuidado para não ser vista nem antes, nem durante, e nem depois. Não queria ter de explicar o que não conseguia explicar sequer a si mesma. Não queria ter de acalmar a mãe dizendo que não estava doida para matá-los à noite, muito menos se defender dos vizinhos que comentavam sobre os prováveis drogadinhos que vinham ali usar o espaço vazio para se aquecer e fumar ou injetar.

— Coisa de drogadinho, isso aí. Você sabe, agora que eles se espalharam pela cidade, a gente não tem mais sossego — dizia Dona Lurdes, indignada, toda vez que passava na frente do terreno baldio.

E ela, muito quieta, via que Dona Lurdes tinha uma coisa má à sua própria maneira; por isso nunca dava nenhuma resposta, por mais que desejasse.

Sua vida ia seguindo, até que um dia, lá por novembro, alguém levou seu latão embora. E ela não queria se arriscar a queimar os papéis e folhas direto no solo, porque o fogo poderia se espalhar pelo mato seco e logo estaria queimando o terreno inteiro, e quem sabe acabasse por queimar sua casa.

Aquela tinha sido uma semana perturbadora. Ficou amuada, seus sonhos não eram sonhos, eram pesadelos, e quando acordava se deparava com a infelicidade. Nos primeiros dias, resistiu com bravura, mas foi se deixando levar, o humor caiu, a esperança caiu, e ninguém conseguiu entender por que ela estava daquele jeito. Ninguém, exceto seu pai.

Ela não sabia, mas o pai conhecia seu hábito escondido. Ela não sabia, mas quando ia se deitar, o pai jogava água fria nas cinzas e ficava à espreita para ter certeza de que o latão não ia virar e botar fogo no mato, e botar fogo na casa, e botar fogo no bairro todo.

Então, quando levaram o latão embora, ele com discrição tratou de arranjar outro. No sábado, convidou a filha desanimada para tomar um sorvete e fez questão de passar na frente do terreno, mesmo a sorveteria sendo para o outro lado, para que ela pudesse ver o novo objeto. E ela viu, e ela sorriu, e ele sorriu, e ninguém disse nada.

| conto do livro Doce olho do furacão e outras fúrias (Editora Penalux, 2021), disponível no [link]. |

Laura Elizia Haubert é doutoranda em Filosofia na Universidad Nacional de Córdoba. Graduada e mestre em Filosofia pela PUC-SP. Já participou de várias revistas literárias, entre elas Revista Subversa, Revista Gueto, Revista Ruído Manifesto e a Revista Ponto do SESI-SP. Publicou, em 2017, pela Editora Patuá, o livro Sempre o mesmo céu, sempre o mesmo azul; em 2019, Memórias de uma vida pequena, pela Quintal Edições; e, em 2021, pela Editora Penalux, Doce olho do furacão e outras fúrias. Atualmente, vive em Córdoba, na Argentina.

‘Goethe e seu tempo’ (Editora Boitempo, 2021), de György Lukács

goethe_tempoGoethe e seu tempo, de György Lukács, traz um conjunto de cinco ensaios do filósofo húngaro escritos durante a década de 1930 e dedicados à obra de Johann Wolfgang von Goethe.

Considerado um dos pontos culminantes da literatura humanista burguesa, Goethe tem sua trajetória esmiuçada e contraposta à de outros contemporâneos seus, em uma análise engajada do grande romance moderno e de seu conteúdo progressista.

Os dois primeiros textos tratam de obras específicas de Goethe e sua construção, ao passo que os três seguintes discutem o contexto social e literário no qual o escritor estava imerso, propondo percepções originais a respeito das motivações, contradições e desafios enfrentados por sua obra.

Trecho de “A teoria schilleriana da literatura moderna” (p. 123)

“A teoria da literatura moderna, da fundamentação de suas particularidades e da razão de ser dessas particularidades, desenvolveu-se, desde o aparecimento da classe burguesa, sempre em estreita conexão com a teoria da Antiguidade. Seria preciso que o domínio da classe burguesa estivesse bem consolidado, que tivesse se tornado óbvio, para poder produzir uma teoria da literatura moderna sem esse paralelo histórico, puramente a partir das condições externas e internas do surgimento dessa literatura. Contudo, no momento em que as bases econômicas da sociedade burguesa se tornaram óbvias, a ideologia burguesa já estava ingressando no período da apologética: ela não dispunha mais de suficiente desenvoltura e intrepidez para investigar de modo cientificamente imparcial as possibilidades ideológicas e artísticas de sua literatura com base em uma análise crítica de seus pressupostos e suas condições sociais. O grande período da teoria burguesa da literatura, que chega a um término com a poderosa síntese histórico-mundial da história da literatura e da arte na Estética de Hegel, baseia-se do começo ao fim na concepção da Antiguidade como o cânon da arte, como o modelo inacessível de toda arte e literatura.”

Continua a leitura do trecho em PDF [AQUI]

Ficha técnica

Título: Goethe e seu tempo
Título original: Goethe und seine Zeit
Autor: György Lukács
Tradução: Nélio Schneider, colaboração de Ronaldo Vielmi Fortes
Revisão da tradução: José Paulo Netto e Ronaldo Vielmi Fortes
Editora: Boitempo
Ano de lançamento: 2021
Mais informações no site da editora [AQUI]

lançamento do livro ‘Do amor e de outras tristezas’, de Rodrigo Novaes de Almeida

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O nosso editor-chefe, o escritor Rodrigo Novaes de Almeida, lança novo livro de contos, que está em pré-venda esta semana (até 22/08) com 15% de desconto no site da editora.

Link: https://bit.ly/doamor_urutau

Editora Urutau, pré-venda:

“Nos treze contos desta coletânea, o escritor Rodrigo Novaes de Almeida traz mais uma vez sua escrita brutal e precisa para colocar diante de nós a dura e por vezes implacável realidade dos nossos dias, sem deixar de lado o humor ácido e as reflexões existenciais característicos em sua ficção. Aqui podemos vislumbrar um escritor maduro, ciente do seu trabalho e com voz própria, afirmando-se como um dos principais nomes do conto contemporâneo brasileiro.”

Rodrigo Novaes de Almeida (Rio de Janeiro, 1976) é escritor e editor. Trabalhou nas editoras Apicuri, Saraiva, Ibep, Ática e Estação Liberdade. Autor dos livros Carnebruta (Contos, Editora Apicuri e Editora Oito e Meio, 2012), Das pequenas corrupções cotidianas que nos levam à barbárie e outros contos (Editora Patuá, 2018), finalista do 61º Prêmio Jabuti na categoria Contos, em 2019, e A clareira e a cidade (Poesia, Editora Urutau, 2020), entre outros. É fundador e editor-chefe da Revista Gueto e do selo Gueto Editorial, projetos de divulgação de literatura em língua portuguesa e celeiro de novos autores.

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Pré-venda de Do amor e de outras tristezas: histórias de violência e morte, de Rodrigo Novaes de Almeida. Disponível no site da Editora Urutau (usar o cupom: doamor), entrega em até 30 dias.
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Voe! Evoé!

selecionados da edição impressa n.2 da revista gueto

capa_gueto_impressa_2Em novembro de 2021 a Gueto completa 5 anos. Neste período, publicamos novos autores e autores consagrados, com o objetivo de divulgar a literatura contemporânea em língua portuguesa. Selecionamos 20 autoras e 20 autores, em poesia e em prosa, publicados no portal no biênio 2019-2020. Esta será, como a primeira, uma edição comemorativa de um trabalho coletivo entre escritores, poetas, curadores e editores.

Agradecemos aos editores Eduardo Lacerda e Pricila Gunutzmann da Editora Patuá pela parceria mais uma vez e ao artista visual Leonardo Mathias pela capa desta segunda edição.

A seguir, os selecionados:

CONTO

1. Adriane Garcia | #Minicontos para futuro nenhum
2. Alexandre Arbex | O ofício da fome
3. Ana Bárbara Pedrosa | Num motel em Loures
4. Christiane Angelotti | Mais uma Maria
5. Dirce Waltrick do Amarante | A diplomacia em banho-maria
6. Fábio Mariano | Infierno
7. Fred Di Giacomo | Ypy
8. Hugo Almeida | Ó
9. Laura Elizia Haubert | Laços
10. Liliane Prata | A culpa é dos poetas
11. Marcelo Maluf | Nada para contemplar
12. Myriam Campello | Obscura Veneza
13. Natalia Timerman | Sábado
14. Rafael Gallo | A única estação
15. Roberto Menezes | De quando a verdade me levantou do chão
16. Rosângela Vieira Rocha | O trovador de Toledo
17. Sergio Leo | Tarzan, o filho do alfaiate
18. Sérgio Tavares | Cruzadismo
19. Tiago Germano | Germes
20. Veronica Stigger | Fantasmas

POESIA

1. Alberto Bresciani | Nomes escritos às ostras
2. Alice Vieira | Prometeu
3. Andri Carvão | O poeta pobre
4. Carlos Emilio Faraco | s/título
5. Francesca Cricelli | Poema para a fiandeira de Remedios Varo em Les feuilles mortes
6. Isabella Martino | Começos
7. Laura Erber | Circunstância da luz
8. Leonardo Tonus | Notas esparsas para um mundo áspero
9. Manuella Bezerra de Melo | s/título
10. Marcelo Labes | A fábrica
11. Maria Esther Maciel | A vida ao redor
12. Maria João Cantinho | Abate diário
13. Matheus Guménin Barreto | O que vale um poema
14. Prisca Agustoni | A fera, primeira parte
15. Rafael Mendes | Resposta a Kaváfis
16. Reynaldo Damazio | s/título
17. Rodrigo Novaes de Almeida | Tocata e Fuga funestas
18. Susanna Busato | Entre
19. Tatiana Pequeno | Abençoados
20. Tito Leite | Acaso

A edição está em pré-venda no site da Editora Patuá neste [link]

fragmento do romance ‘Elas marchavam sob o sol’, de Cristina Judar

Elas marchavam sob o sol (Editora Dublinense, 2021)

capa_sob_solMortas podem ser as pessoas, mortas podem ser ideias e revoluções enterradas às pressas, antes que floresçam e mudem definitivamente a ordem das coisas.

Mortas podem ser as mulheres, enterradas vivas pelo fato de não serem vistas, quando, de fato, elas são os planetas, as deidades, o fundo do mar, tudo o que é incontável ou impossível de se medir.

Uma lenda que trago comigo: em um passado remoto, havia uma velha, ela vivia em um deserto e soprava ossadas que encontrava pelo caminho. Havia velas acesas no interior do seu corpo antigo.

Ao despejar sobre as ossadas o calor das suas entranhas, a velha as preenchia com carnes e narrativas que delineavam formas nada correspondentes às necessidades de consumo dos homens.

Desertos são oceanos extintos: os esqueletos se transformavam em conchas e somente depois se tornavam corpos. Esse era o seu pequeno milagre.

Ela sempre se assombrava com o acúmulo de ossos sobre o chão. Em posições variadas, eram favoráveis ao reconhecimento de que haviam pertencido a mulheres.

A velha caminhava entre eles como quem não quer pisar em ovos, ela era uma jardineira de flores calcificadas. Naquele canteiro sem água, havia um registro raro e diversificado. A secura pode conter germinações e reter temporalidades, embora sejamos convencidos a acreditar no contrário.

Dia a dia, a velha regava suas joias inertes com o ar e o fogo, com um passear ritmado e um canto que, de tão rouco, parecia ter nascido no início do mundo. Naquele lugar em que todos os acontecimentos são ideias não projetadas na realidade linear, pólen em suspensão, raio de sol sem parada fixa. Ela observava as ossadas como se as acariciasse.

Exalava chamas e reconstituía o que estava perdido — não apenas os corpos, mas a beleza oceânica deles, aquela que está contida no movimento e os define na ausência de limitação, na geometria dinâmica das ondas, no cheiro do sal.

Elas marchavam sob o sol, lançado 4 anos depois de seu último romance, apresenta narrativa sobre aprisionamentos relacionados ao feminino e a corpos dissidentes. Saiba mais no [link].

Cristina Judar nasceu em São Paulo, é escritora e jornalista, autora do romance Oito do Sete, ganhador do Prêmio São Paulo de Literatura 2018 e finalista do Prêmio Jabuti do mesmo ano. Escreveu o livro de contos Roteiros para uma vida curta (Menção Honrosa no Prêmio SESC de Literatura 2014) e as HQs Lina e Vermelho, vivo. Seus textos curtos também figuraram em diversas antologias publicadas no Brasil e no exterior. Elas marchavam sob o sol é o seu segundo romance.