a sorte se esconde no amanhã
quando o motor pega no tranco
e o clima pesa sobre os ombros
penso na vida de minhas gatas
e imagino o que elas sonham
essa imagem preservo por dias
emolduro e guardo
calculo o que vejo
meço, peso, observo
a febre dos animais
a alegria dos peixes
a conversa das estrelas…
sei que as sementes da voz
se expandem na boca do tempo
e que não há fundamento maior que a coragem
— o amanhã traz uma sorte desconhecida.
farrapos da imprecisão
é privilégio dos vivos ter lembranças
coisas guardadas onde não sabemos onde:
de um avô, lampeja a velhice esbranquiçada em passos bem curtos
com palavras que não criavam raízes dentro da frase.
do outro, a matéria dos olhos assertivos-esverdeados
semeando a terra, plantando cajus e lutando contra as formigas.
de uma avó, ficou a potência de uma mãe de muitas mulheres
que não tiveram a sua mesma força.
da outra, a doçura-alegre de quem gostava de bananas
e nos enchia o bucho de coisas boas.
— o que fica, são os farrapos da imprecisão
alguns fleches não revelados da máquina.
reabitar 2
1
a esperança
desafia a gravidade
e levanta os mortos
reanima os segredos da casa
com o toque do invisível
perturbamos
os domínios da morte
com nossa felicidade.
2
o irromper da luz
e sua energia
intangível
magnetismo
que me faz
manter os olhos
no nascente
e imaginar um lugar
que deus
não conheça.
Demetrios Galvão (Teresina-PI) é poeta, editor e professor. Autor dos livros de poemas Fractais Semióticos (2005), Insólito (2011), Bifurcações (2014), O Avesso da Lâmpada (2017), Reabitar (2019) e do objeto poético Capsular (2015). Tem poemas publicados em diversas antologias, revista literárias e é coeditor da revista Acrobata, em atividade desde 2013.