fractais
Pelo mergulho
das sombras,
calculo
o itinerário da luz.
Meço
os contornos de nossas ruínas
na matemática particular
dos desesperos.
Abro a janela
da página do sonho:
soletro, devagar, o Aywu rapitá:
o ser do ser da palavra,
(flor pronunciada
entre as estrelas).
A noite
desaba sobre as telhas
na explosão de um meteoro.
Conto estilhaços,
recomponho parábolas:
um mínimo do que sou
lembra as fronteiras
do Universo.
a música
Para Isaac Duarte
Sem pedir licença,
insinua-se pelos cômodos,
invade os espelhos,
derrama suas jarras de luz.
Vejo-a
pelos canteiros da casa,
na nitidez dos bordados
de minha mãe,
no brilhar de tua íris
quando os deuses descem
para beber a insensatez
das águas.
Depois,
ela se transforma em seios,
goiabas,
espigas.
E nua, adormece,
enquanto a lua brinca
entre meus dedos
e lagartixas
passeiam pelas pedras do pátio…
pampas
Para Hildebrando Pérez Grande
São sempre linhas
as paisagens,
a cortarem geometricamente
nossas rotinas.
As curvas senoidais
das serras,
as retas dormentes
das planícies.
E nós:
pequenos pontos
num papel rasgado.
Everardo Norões nasceu no Crato, Ceará (Brasil). Viveu na França, Argélia, Moçambique. Atualmente reside em Portugal. É autor de vários livros de poesia, entre os quais A rua do padre inglês, Retábulo de Jerônimo Bosch e Poeiras na réstia. Recebeu vários prêmios literários, entre os quais o Portugal Telecom da Língua Portuguesa 2014 pelo livro de contos Entre moscas. Publicado em várias revistas literárias, como Granta (edição brasileira), Gare Maritime e Bacchanales (França), Quimera (Espanha), Martín (Peru), entre outras. Seus poemas foram traduzidos em francês, inglês, italiano, espanhol, catalão e quíchua.