cinco poemas de Thiago Medeiros

pressa em dizer
tanta coisa

sinto a presença
divina quase a
encostar-me os
calcanhares

* * *

acho abusivo
ligeiramente
abusivo

de todas as
minhas
desistências
é a única
que insiste

* * *

foi meu
primeiro medo
e até hoje não
nos falamos

te confundia
com a lerdeza
de uma noite
inteira com os
olhos abertos

nunca temi
escuridão
tempo é
que me
apavora

e disseram
que és
senhor dele

depois cultivei
medo das rãs
e de penas de
pavão

disseram-me
que também
eram crias
suas

de certas colheitas
também me veio
medo dos cabelos
em ralo de chuveiro

disseram-me
que nenhum
deles me cai
sem tua vontade

* * *

eternidade
eu que não
a compreendo

de certeza
envolve
tédio

suficiente para
que te preocupes
em tirar-nos fios
de cabelo um a um

há hecatombes
há holocaustos
há dores de hérnia
há extinção dos ursos polares

mas tuas vontades
residem no escalpelamento
de bulbos capilares
em um por um

* * *

então repito
que tenho
pressa

sigo
a correr

antes que
emudeça
de exaustão

sei que
um dia
me alcançarás

é teu hálito
que me faz
suar os calcanhares

e é lá
que há
de me tocar

grande será
minha queda

já ouço os
aplausos do
mundo

já ouço meu
nome em
boca de
pastores

acompanhados
provavelmente

de

satanista
maldito
viciado
alcoólatra
depravado
divorciado
enganador de velhinhos nas apostas de jogo do palito
[afinal
_____valia cerveja]
comunista
canibal amante de corpos
e
carnavalesco

na verdade

só tive um
grande medo
na vida

um medo
de quatro
letras

tenho medo
do amor

disseram-me
que todos os
infernos das
terras que
sequer conheço

foram criados
por amor a mim

deus

depois
de tanto
tempo

apenas peço

não me
toque
os
calcanhares

não enquanto
corro com medo

do teu amor
por mim

Thiago Medeiros é pernambucano de Caruaru. Escritor e agitador cultural. Idealizador do Encontro Literário Letras Em Barro e da Oficina Levante Literário. Publicou o livro de contos Claro é o mundo à minha volta, pela Editora Patuá. Organiza, junto com o poeta Andri Carvão, o Simpósio de Poetas Bêbadxs. Publicou em revistas como Mallarmargens, Gueto, Bibliofilia Cotidiana, Variações e Xapuri. Escreve para não esquecer de si mesmo.