três poemas de Alice Vieira

BREVE GLOSSÁRIO DO INTRADUZÍVEL EM RUSSO

I

туча [tútcha]:

uma nuvem — carregada —
será a tristeza ou
um lance de dados
façam suas apostas se

um poema, um coágulo

II

Cоловей-Pазбойник [Soloviei-Razbôinik]:

teu nome, poeta
tua mão assassina
num imbróglio
homem-pássaro
fogem de ti
como da morte
tua canção avilta
teu silvo anuncia
uma sombra
um sabre de batalha

NUNCA ENTENDI QUEM ESCREVESSE ROMANCES

Nunca entendi quem escrevesse romances.

Canta, corpo
salvo você
quem me fabrica?
quem azula um risco
na cútis
quem afunila a matéria
suspensa
ao perigoso estrondo?

PROMETEU

quem perde o medo de morrer não perde
nada
puir o rosto e o invólucro
para exibição aos meus pares
espera-se que eu, às vezes,
me veja refletido
espera-se que eu, às vezes,
faça menos barulho
não atrapalhe
o sono dos outros
quem perde o medo de morrer
não reconhece
o fogo sagrado
não dá aos homens
dissolutas

mãos de pedra

Alice Vieira mora em Belo Horizonte desde 2009. É doutoranda em Estudos Literários pela UFMG. Tem poemas publicados nas revistas Germina (2016), Em Tese (2018), Gueto (2018) e Ruído Manifesto (2019). Publicou, em outubro de 2018, seu primeiro livro de versos, intitulado {Open Source}, pela Editora Penalux. Em 2019, fez parte da coletânea Poemas Reunidos I da revista portuguesa A Bacana.