cinco poemas de Mário Alex Rosa

a dimensão das coisas

Tenho por ela
a dimensão das coisas:
à noite, as estrelas aventuradas
contadas como segredo revelado.
O céu que se expande
no amor que se ganha
amplia o toque das mãos
enlaçadas por instantes de afetos
demorados na eternidade.
Tenho por ela
o que não se pode perder:
o silêncio das manhãs de cafés
a cor viva da laranja que convida
a palavra repartida na ponta da língua
a dar ao dia sua melhor fatia.
Tenho por ela
o que não se dimensiona
a começar pelo começo
que já é infinito.

poetry

Escrever preto no preto
não na imagem branca do branco
árido de luz branca que se ofende
ao dar a escrever preto no branco
vazio de infiltração?
Escrever com a luz negra da ponta
do lápis firme na sua empreitada
divergente à luz pálida do branco.
Escrever no escuro do preto
contra e sem ver você.

dúvidas apócrifas de JCMN

Sempre quis evitar a si,
Mas evitando um eu,
Outros apareceram:
Pernambucou-se e sevilhizou-se.
Não há de quê não testemunhar
Que se seu pudor cabralizou-se
Na confissão que por avesso se impôs
Habitado por fora o que se esconde por dentro?
Entre a palavra e a pedra, o poeta
Quis falar da coisa em si,
Substantivo concreto ou mineral
Quem não duvida era o (in)certo?
Não há como saber,
Mas sabendo por saber
Que diante de tantas coisas
Contrárias em si não seria a mesma coisa?

catar o sujo

Fazer o poema
é varrer o sujo da casa
acumulado por todos os cantos
da quina dos quartos
ao fundo das gavetas
abarrotadas de mundos
impróprios.
Fazer o poema
é refazer o sujo
habitado na incômoda
cômoda estacionada
no quarto do passado.
Fazer o poema
é catar o sujo de onde mais
se esconde o oculto presente.
É olhar no espelho de frente
a impureza do poema.

três palavras

Tenho três palavras:
alegria, felicidade e amor.
E nada sei delas e nem elas de mim.
Se for para compor um poema sobre a primeira,
Bastaria apenas dizer: alegria.
E nada seria diferente com a segunda: felicidade.
Já o amor, essa sim demoraria o infinito
Para sabê-la numa só palavra
Que por si só o poema bastaria.

Mário Alex Rosa é natural de São João Del Rei. Licenciado em História pela Universidade Federal de Ouro Preto. Universidade de São Paulo, com dissertação sobre o livro Farewell de Carlos Drummond de Andrade, e Doutor em Literatura Brasileira também pela USP, com tese sobre a poesia de Armando Freitas Filho. É autor dos livros infantis ABC futebol clube (Editora Aletria, 2015) e Formigas (Cosac Naify, 2013); dos livros de poesia Ouro Preto (Editora Scriptum, 2012) e Via Férrea (Editora Cosac Naify, 2013). É editor na editora Scriptum — BH e da coleção Lição de coisas — Tipografia do Zé — Belo Horizonte.