o deserto de Sonora
feito leão albino ao sol do meio-dia
corpos femininos & mortos desovados por toda Santa Teresa
combinados ao fedor e feiura
(não fossem objetos de crimes, só
apêndices na geografia maldita),
putas que assassinam e chamadas
telefônicas no aparelho que não funga,
não recebe nem envia maydays
tu viestes evadido, ofertando maravilhas
boas e más
travestidas em linguagem, denunciando o Chile,
transando/trançando México, Las Vegas, Paris, Alemanha,
um mundo teu libelo-quintal
respirando jornalismo mas vomitando
noticiários alargados pela
mentira literária — nos processos,
entre exterminar cigarros e leituras,
mariposas se batem sincronizadas
nas lâmpadas amarelas a te hipnotizar, ideação
do livro aberto descansando no varal,
O testamento geométrico de Rafael Dieste
legando à brisa a resolução que o
professor viado de literatura latino-americana abandonou
evocando Duchamp
porque arte cênica é
tática, titânica,
trisca turva e térmica
totalmente tola a torcer os tipos
tais o boxista e o mergulhador
neste ínterim
os detetives perscrutam e continuam
selvagens como o Terceiro Reich
em si e na escrita terceiromundista
(só inquirir não protege o interrogador
de não se afetar pelo que ouve)
entre tu e tantos, a afinidade constatada: a literatura um refúgio, um sustento
uma escada-tobogã
nada os torna mais íntimos do que isto, chileno
a tola tentativa de traduzir-se por palavras seja no teclado que for
põe músicas gestando dançarinos confortados pelas derrotas
Andrei Ribas é autor dos livros Cada amanhecer me dá um soco (Bestiário, 2016) e Romântico visceral sob o céu fragmentário (Bestiário e Artes & ecos, 2017). Tem trabalhos reproduzidos nas revistas eletrônicas Plural, Flaubert, R.Nott, Pessoa, Mallarmargens, 7faces, Subversa, Gueto, entre outras.