poema para um sábado
Luz amena
O céu coberto de
Manta de algodão
Experimenta a preguiça
(como são deliciosos
os pecados capitais)
Manda uma chuva
Fininha
Para nos distrair
Do atraso do Sol
A água
Lânguida
Lambe plantas
E pedras
O dia é um gato
Se enroscando
Nas pernas.
oftalmológico
Um céu tão amplo
O mar este vasto
O mundo grande
A perder de vista
De repente céu
Para além da ponta
Dos edifícios
Miopia é vício
De só enxergar
De perto.
os vivos
Da não agressão
Da inveja nula
Da cobrança reduzida a
Zero
Da aceitação sem nome e do
Silêncio
Do livre transitar sem
Julgamento:
Gosto mais dos mortos.
vó preta
Minha avó morreu hoje
Não creio que mortos
Descansem
Creio sim que vivos
Percorrem
O caminho entre as tumbas
Cansados
Passam pássaros em revoada
Um cão tranquilo adota uma lápide
Crianças não dão a mínima
Para o que não seja
Brinquedo
Eu sinto o odor incômodo
Dos crisântemos
Arrancados.
morrer
A beleza pousa na ampulheta
Ruflar asinhas ninguém escuta
A vida e a morte no pé de murta
Só dura um dia essa borboleta.
Adriane Garcia, poeta, nascida e residente em Belo Horizonte. Publicou Fábulas para adulto perder o sono (Prêmio Paraná de Literatura 2013, Ed. Biblioteca do Paraná), O nome do mundo (Ed. Armazém da Cultura, 2014), Só, com peixes (Ed. Confraria do Vento, 2015), Embrulhado para viagem (coleção Leve um Livro, 2016), Garrafas ao mar (Ed. Penalux, 2018).