cinco poemas de Adriane Garcia

poema para um sábado

Luz amena
O céu coberto de
Manta de algodão
Experimenta a preguiça
(como são deliciosos
os pecados capitais)

Manda uma chuva
Fininha
Para nos distrair
Do atraso do Sol

A água
Lânguida
Lambe plantas
E pedras

O dia é um gato
Se enroscando
Nas pernas.

oftalmológico

Um céu tão amplo
O mar este vasto
O mundo grande
A perder de vista

De repente céu
Para além da ponta
Dos edifícios

Miopia é vício
De só enxergar
De perto.

os vivos

Da não agressão
Da inveja nula
Da cobrança reduzida a
Zero
Da aceitação sem nome e do
Silêncio
Do livre transitar sem
Julgamento:

Gosto mais dos mortos.

vó preta

Minha avó morreu hoje
Não creio que mortos
Descansem

Creio sim que vivos
Percorrem
O caminho entre as tumbas
Cansados

Passam pássaros em revoada
Um cão tranquilo adota uma lápide
Crianças não dão a mínima
Para o que não seja
Brinquedo

Eu sinto o odor incômodo
Dos crisântemos
Arrancados.

morrer

A beleza pousa na ampulheta
Ruflar asinhas ninguém escuta
A vida e a morte no pé de murta

Só dura um dia essa borboleta.

Adriane Garcia, poeta, nascida e residente em Belo Horizonte. Publicou Fábulas para adulto perder o sono (Prêmio Paraná de Literatura 2013, Ed. Biblioteca do Paraná), O nome do mundo (Ed. Armazém da Cultura, 2014), Só, com peixes (Ed. Confraria do Vento, 2015), Embrulhado para viagem (coleção Leve um Livro, 2016), Garrafas ao mar (Ed. Penalux, 2018).