gueto entrevista Laís Araruna de Aquino

capa_araruna1. Para começar, conta um pouco sobre o livro Juventude, ganhador do Prêmio Maraã de Poesia 2017, publicado recentemente.

Juventude reúne poemas que escrevi até o final de 2017, quando, então, submeti o conjunto ao Prêmio Maraã de Poesia. Os poemas não têm uma identidade temática definida, mas todos se relacionam diretamente a meu espaço de experiência e, indiretamente, às questões filosófico-existenciais que me acudiram no período (deus, mortalidade, o ser, o nada e à consciência) — e das quais nunca nos livramos.

Trata-se, no mais das vezes, de reabilitar as minhas próprias vivências à luz do sopro da poesia, como se da província ou de um sujeito que se confunde com sua província pudesse exsurgir o sentimento do universal.

Fazendo um paralelo, Clyfford Still, pintor de quem gosto bastante, disse algo que — entendo — se aplica aos meus poemas: “Quando eu exponho uma pintura, eu gostaria que dissesse: ‘aqui estou eu: esta é minha presença, meus sentimentos, eu mesmo’”.

2. Como costuma ser seu processo de criação?

Não tenho uma rotina pré-definida sobre como e quando vou escrever. Como disse Ferreira Gullar, somente escrevo — ou me proponho a escrever — quando sou tomada pelo espanto. Quando isto ocorre, posso levar dias ou, às vezes, meses escrevendo um único poema, para que fique com uma forma que considero aceitável.

3. E como foi o processo de criação com Juventude?

Os poemas desse livro seguem o que falei acima. No entanto, os mais antigos têm certa liberdade de forma que hoje não consigo reproduzir. Escrever torna-se, a cada vez, mais difícil, porque temo a repetição.

No entanto, é certo, se eu buscasse uma “originalidade” a cada poema, teria de permanecer em silêncio. Como vejo as coisas, tudo já foi escrito e a busca de uma subjetividade criadora é um mito.

Agora, uma anedota. Duchamp passou 20 anos sem realizar uma obra, porque disse, várias vezes, que não tinha mais ideias e não queria se repetir. Talvez, se eu levasse isto a sério, não escrevesse mais nada. No entanto, escrever é uma exigência: é uma forma de expressão pessoal de que não posso me livrar.

No entanto, se, do ponto de vista do processo de escrita, é mais ou menos assim, do ponto de vista do mundo, não. Como falou Szymborska no seu discurso do Nobel, contrariando o Eclesiastes, tudo é novo sob o sol.

Isto é, a apreensão do mundo — este locus onde os homens são vistos e ouvidos, desde uma posição não intercambiável — sempre está a mudar, já que a ação — e o discurso — instaura novos começos, cujos resultados não são previsíveis. Além disso, citando um poema, “a madeira desbota e os teus cabelos vão a cinza”. Trata-se do devir em que todos estamos mergulhados.

4. Já tem um novo projeto em mente? Qual é? Ou costuma dar um intervalo na escrita entre um livro e outro?

Juventude é meu primeiro livro. Eu não parei de escrever desde que comecei. Já possuo vários poemas novos, que, segundo espero, comporão um segundo livro — a se chamar, provisoriamente, Madureza.

Como disse antes, se um intervalo surge, é porque, nesse tempo, não fui sacudida pelo espanto — ou tive preguiça de trabalhar sobre uma imagem ou uma ideia.

5. O que você diria para quem está começando a escrever? Por que você começou a escrever?

Comecei a escrever porque sentia uma exigência que me impelia a tanto. Acho que Mark Rothko estava certo quando disse existir uma “necessidade biológica de se exprimir”. Quando escrevo, desejo que o resultado seja um prolongamento de mim no mundo — mesmo que ninguém leia ou venha a conhecer o poema.

O poema exige ser lido, mas não precisa, necessariamente, de fato, ser lido.

Acho que não tenho nada de relevante para dizer a quem começou a escrever. A não ser para se arriscar nessa aventura.

Laís Araruna de Aquino nasceu em 1988, no Recife, onde vive. É formada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e Procuradora do Município do Recife. Juventude (Ed. Reformatório, 2018), ganhador do Prêmio Maraã de Poesia 2017, é seu livro de estreia.

Três poemas do livro Juventude, de Laís Araruna de Aquino, saíram na revista gueto no dia 14 de novembro, você pode ler aqui: [link]