cinco poemas de Virna Teixeira

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vou me mover continuamente mas não vou me mover, não quero compromisso, desculpe mas tenho que trabalhar, estou ocupado, eu não quero um relacionamento, temos expectativas diferentes, acho que nunca me apaixonei, o amor é um psicose, eu odeio a mulher que me dispensou, eu odeio a mulher que dispensei, ela me odeia, ela odiava minha bebida, ela era assexuada, sua raiva me lembra a raiva dela, eu tenho medo de você, eu vou te amarrar, eu vou chamar a policia, você disse que eu era um misógino, você é maravilhosa, estou adorando esse tempo juntos, por favor se cuida, eu vou esperar por você, eu não farei nenhum movimento, eu não vou dormir com ninguém, enquanto eu me movo continuamente imóvel na minha passividade

o quarto de casal

Como domar um leão. Exercitando triunfo com audácia excessiva, fantasia, e uma narrativa limítrofe. Negando um perigo quase intolerável. Neste sonho ela se perdeu no escuro, bêbada, pisando sobre corpos nus. As violações não foram imediatamente percebidas como traumáticas. Então ela perdeu toda a bondade. Ela estava re-encenando, de vítima a dominadora, furiosa, livre de contenção, rasgando sua meia-calça, curando-se selvagemente, batendo, acalmando-se, pedindo contenção. Impotência transformada em raiva, protegendo ela, protegendo sua mágoa, purificando, enquanto Carmen Miranda sorria e acenava para ela contra um céu em chamas.

s/título

Margem contínua de ansiedade,
explodindo plástico inevitável

Visão esférica, borrada,
retina alinhando a superfície interna do globo
o aço da porta corta-fogo pintado de branco

Se todas as coisas pudessem ser contadas

Escute o medo. Prova contras as emoções mais ásperas,
luxúria e solidão sob efeito de anfetamina

A armadura faminta da adicção,
uma antiga marca japonesa de hipnóticos chamada
dançarina das nuvens

arena

As cartas falam melhor se você aparece. Vamos olhar para o seu passado. Esta aqui representa você. Eu vejo forças. Eu vejo mudanças, uma batalha. Eu vejo uma viagem. Aquela é você. As cartas são difíceis de ler. Vamos tentar de novo. Embaralhe, corte. A carta do enforcado indica sofrimento. As mãos e os pés estão suculentos. É uma transformação completa de toda a sua existência.

Eu tenho meu orgulho. Você virá correndo. A vida justifica nossos desejos. O que é bom num dia, não é no próximo.

Que drama queen. Como ela reage. Ela precisa ser adulada como uma criança. Ela só quer atenção. Ninguém me mima, ninguém me ama. Fique calma. O mais importante é a sua saúde.

Eu não leio mãos. Eu não sei.

arena II

Que acha das mulheres paraquedistas? Que loucura pular daquele jeito. Isso machuca. Mas me faz bem. Agora que me espreguicei vou me alongar. Você é a minha melhor plateia. Se ao menos pudéssemos sair de férias. Uma cartomante viu nas cartas. E agora, este imenso medo da morte.

Nós estamos na mesma bolha. Eles amam pela metade. Eles se contêm. Então eu paro no meio também. Sempre tive medo de ceder.

Deixe eu tirar uma foto. Mais tarde, vamos esquecer. Resta pouco tempo. Eu tenho a sensação que meu medo passou. Eu tenho a sensação que estou feliz. Temos bastante tempo. Deixa eu te convidar para um jantar romântico. Quer ir para um restaurante com terraço ou para outro lugar?

Virna Teixeira nasceu em Fortaleza. Publicou três livros de poesia no Brasil pela 7 Letras e Lumme Editor, e três títulos de tradução de poesia escocesa. É neurologista e vive em Londres. Publica poesia lusófona em tradução pela sua editora, Carnaval Press. Seu último livro, A Terra do Nunca é Muito Longe (2014), saiu pela Não Edições em Lisboa, e foi reeditado em versão bilíngue em Londres em 2016. Alguns poemas desta amostra saíram na revista Alba Londres e na revista portuguesa Devir, e fazem parte da sua próxima coleção, Love is a Psychosis.