as tranças do transposto, poema de Sidnei Olivio

ver de perto essa torre abandonada
antes que o moderno a desmorone.
fui à infância um príncipe de short e chinelo

a salvar toda ilusão de herói urbano.
poso de terno e gravata ao autorretrato
junto à placa da rua envelhecida

com vestígios de cabelos e furos de bala.
no alto rodeada por uma auréola de nuvens
com textura de aquarela

as janelas estão lacradas
(a da esquerda ainda deve guardar
secas algumas gotas de sangue

e suor do meu inútil esforço).
ainda são verdes as paredes
atrás de tantos anos de silêncio

e exibem inéditas algumas pichações.
na remota tentativa de resgatar o transposto
de memórias inexatas e infantes

quando toda imaginação fazia sentido
pego de volta o recente e com ele sigo.
a despeito da foto na estante

a história não se contará como antes.

Sidnei Olivio. Biólogo. Tem três livros de poesia editados pela HN Editora e Publieditorial, o limite da razão, 2011, Uni-verso: a natureza da poesia e a poesia da natureza, 2012 e A Transgressão da Palavra, 2013. Um livro publicado pela Editora Patuá, as 7 faces da cidade, 2014.