teologia negativa
Nas maçãs do mistério um louco
morde a sombra
do sol.
Sob o peso
da solidão
é o meu número.
Hoje a comarca não me compra.
Uso sapatos
de chumbo para o vento
não me roubar.
Mostro a imensa substância
das noites escuras
de San Juan de La Cruz.
Na fuga
do hospício etéreo
a realidade se salva em porta:
arranha-céu.
moinhos de vento
Raquel chorava seus filhos trucidados
— eu choro os livros
não nascidos.
São pêndulos os anjos que quedam.
Na essência que me conflagra
minha metafísica estreita
os êxtases que escapam
dos molares de moinhos.
A incompletude irrompe
uma absurdidade incômoda.
Quero que sejam transcendentais
os acidentes.
Sublimo com água ácida
o eclipse que espelha
minha ascese de tarde.
Em pólvora e fogo guardei-me
nos sabres metálicos da noite.
No meu pouco tenho o limo
que safira a gema celeste.
amadurecer instantes
No entreter das capitais,
o lenho da solidão é consumido
pela geleira da multidão.
A lua late para o húmus —
o mar cega o sol:
o mundo é diáspora.
Enxadas em Orion,
corpos nos canaviais.
O fim não faz juízo:
o inferno reclama o céu.
A vida custa menos do que uma bala:
natureza morta das constituições.
Para o velho escriba
a tipografia é mais potente
que uma usina nuclear.
Ele faz, sangrando,
uma casa na nuvem.
| poemas do livro Digitais do caos, selo Edith, 2016. |
Tito Leite nasceu em Aurora-CE (1980). É poeta e monge, mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Têm outras coletâneas publicadas nas revistas Mallarmargens, Germina e na portuguesa TriploV. Digitais do caos (selo Edith, 2016) é o seu primeiro livro.