As dádivas entregues
Quando pensas no mundo
Aonde levas o destino de delírios
Ou curva-te serenamente
Às dádivas entregues?
Amanhece como a forma condensada
Em chão de terra vermelha
Segue a orfandade
Espelhada pelo mapa
Onde fumaças de nuvens como mísseis
Eram países entre um oceano
A linguagem destituída da origem
Em que se apreende
No teu próprio corpo.
Onde renasce o silêncio
Hoje o mundo veio à forma de dois campos
De colheitas. Num vesti a roupa dos trigais
Noutro, os pássaros fizeram do corpo morada.
Seria essa a biografia conjugada
Aos vegetais, um corpo erguido ao ar
Migratório das cercanias do coração.
Para o dia que nasce, para a folha que morre
Veio até mim a claridade,
Sinal áureo que renasce
Acima de mim e dentro
A puxar o condão do mundo
Da vida tornada planta ou raiz numa perda
Verdejante quando palpável ao olhar.
A espera perde-se incomunicável
Para vê-la renascer num silêncio.
Entre o som e o silêncio
Palabras exigen silencio y espacios abandonados.
Alejandra Pizarnik
Tu vinhas sem um nome e fizestes
Da fábula um berço
Caminho, entre o som e o silêncio.
Vinhas sem nome de um alfabeto ágrafo
Suspenso em um invólucro de nuvens.
Quando fizestes do corpo a nudez
Negastes a luz para fechar os olhos
E ver como as nuvens ficam nuas
Magenta, madureza, música de pisares
O céu. Mas ao vê-la, luz interior,
Tudo isso sabia de cor
Como em ti a entrega de um corpo.
| do livro Passos ao redor do teu canto, Editora Patuá, 2015. |
Maria Carolina De Bonis, São Paulo, nasceu em 20 de dezembro de 1982, estudou literatura e escreve para mudar os caminhos por onde passa ou perder-se em alguns deles. Publicou o livro de poesias Passos ao redor do teu canto, pela Editora Patuá na Coleção Patuscada (2015), projeto premiado com o ProAC.